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Como Ritchie, um britânico apaixonado pelo Brasil, compôs ‘Menina Veneno’

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O abajur é cor de carne. Isso não está aberto a discussão. “Chegou ao ridículo de me falarem que eu estava cantando a música errado”, diz Ritchie. Autor de “Menina Veneno”, o britânico foi vítima de uma espécie de fake news há alguns anos. Diziam que a cor do tal abajur era carmim. “Musicalmente, carmim nem rola”, diz ele, teorizando sobre métricas poéticas do português com um sotaque britânico sutil.

Com 70 anos recém-completados, Ritchie comemora este ano as quatro décadas do lançamento de seu disco de estreia, “Voo de Coração”, que o alçou ao topo das paradas brasileiras e será revisitado em maio, em apresentação única em São Paulo, no Cine Joia.

“Estou muito animado com esta volta. É a volta de quem não foi, porque sigo fazendo meus shows, mas discretamente”, diz. “As pessoas querem ouvir os hits, e eu estou ali no palco para servir. Quem sou eu para levá-los para passear num bosque onde não conhecem ninguém?”

O que Ritchie abre a debate, ao contrário da cor de carne, é a interpretação sobre a tal menina veneno. Há ali um apanhado de referências que vai dos ruídos que sua filha, um bebê à época, fazia ao subir a escada de seu duplex em São Conrado até conceitos da psicologia junguiana e uma placa de caminhão, de onde saiu o título da canção.

“A menina veneno tem um pouco de femme fatale, de Lorelai, de sereia. Queria uma música sobre uma manifestação de sonho e veio essa história meio onírica”, conta. “Cor de carne é a carne do Carnaval, a carne de ‘A Carne é Fraca’, a carne da pele, e o Brasil tem muitas cores. É uma história que contamos nesta a música.”

A história do disco também tem um quê de onírico. Em 1983, Ritchie ganhava a vida como professor de inglês e se jogava como músico em projetos esparsos. Fazia alguns anos que frequentava os círculos musicais de Rio de Janeiro e São Paulo, gente que conhecera por intermédio de Rita Lee -amiga desde Londres. Ele chegou a lançar um álbum com a Vímana, banda que integrava ao lado de Lulu Santos e Lobão. “A gente era pretensioso”, diz. “Queríamos ser o Yes, o King Crimson.”

Outro parceiro era o poeta Bernardo Vilhena, com quem escreveu “Menina Veneno” em apenas vinte minutos. O artista gravou a canção e bateu à porta de gravadoras para vender o projeto. Amargurou negativas. O primeiro contrato veio por um desses acasos da música, quando Fernando Adour, arranjador de Roberto Carlos, ouviu de soslaio a música do jovem e o diretor da CBS, Toma Muñoz, topou o contrato.

O álbum foi lançado no início de 1983 e chegou ao título de Disco de Ouro em apenas duas semanas após o lançamento. “Naquele ano, vendi mais que Michael Jackson com ‘Billie Jean'”, diz.

“Voo de Coração” é um disco entre mundos, não só porque ali reside um britânico culto que se apaixonara ainda jovem pelo Brasil, em 1973. O álbum soa tardio para as invencionices do rock que ecoaram nos anos 1970, de Raul Seixas a O Terço, e também tem ar antecipado para o synth pop que encharcou o rock nacional nos anos 1980.

“Quando a gente embarcou na ideia do pop, a gente reduziu tudo aquilo”, diz Ritchie. “A gente embarcou em ideias mais digeríveis no disco, mas sem perder a coisa progressiva. Meu pop pode ser progressivo.”

Pelo Interfone” é uma balada romântica ritmada por uma batida de bateria eletrônica pré-definida. Já em “A Vida Tem Dessas Coisas”, segunda faixa do álbum, Ritchie acompanha a melodia de teclados que emulam pianos e cravos. Guitarrista da banda de rock progressivo Genesis, Steve Hackett faz parte do disco na faixa que lhe dá nome e versa sobre hologramas, computador e solidão.

“Steve Hackett era casado com uma brasileira e eu o conheci em 1980, num carnaval em Itaipava”, lembra Ritchie. “Pegamos uma guitarra emprestada do Lulu Santos para ele gravar ‘Voo de Coração’.”

O show de homenagem ao disco também contará com faixas de outros momentos da carreira de Ritchie. É o caso de “Transas”, single que entrou na trilha sonora da novela “Roda de Fogo”, de 1986, e “Shy Moon”, composta com Caetano Veloso.

A apresentação também será uma comemoração do mais longo voo de Ritchie. Em 2022, o britânico completou 50 anos no Brasil e somente então conseguiu um visto de residência por tempo indeterminado no país. “Sou um estranho no ninho. Sou um Englishman Carioca”, diz, parafraseando a música do conterrâneo Sting, “Englishman in New York”.

RITCHIE
Quando 25 de maio, às 20h30
Onde Cine Joia – praça Carlos Gomes, 82, Centro, São Paulo
Preço De R$ 110 a R$ 400
Link: https://pixelticket.com.br/eventos/13067/ritchie-em-sao-paulo/ingressos

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